“O avô na sala de estar: a prosa leve de Antonio Candido” mostra a intimidade do crítico literário a partir de conversas com sua neta
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Antonio Candido (1918-2017) foi uma figura marcante. Referência no meio acadêmico no que diz respeito à crítica literária e literatura comparada, foi professor de duas das maiores universidades brasileiras (USP e Unesp), além de ter tido vasta atuação política nos movimentos de esquerda no Brasil, entre elas, a participação na fundação do Partido dos Trabalhadores (PT).
Um lado desconhecido, porém, de quem não convivia de perto com Candido, é o de sua intimidade. Sua fala íntima é desnudada em O avô na sala de estar: a prosa leve de Antonio Candido, documentário de média metragem dirigido por Marcelo Machado e Fabiana Werneck a partir do material coletado por Maria Clara Vergueiro, neta do intelectual, durante tardes de almoço em seu apartamento. Produzido pelo Sesc São Paulo, o doc estreia no dia 8/11, às 22h, no Sesc TV.
A partir de 9/11 fica disponível gratuitamente na mesma plataforma, bem como no Sesc Digital, como parte da programação Cinema em Casa.
Para mostrar um lado de Candido ao qual seus leitores não tinham acesso, o filme parte do macro, com seu apartamento cheio de fotos, livros e histórias, para chegar ao micro: os detalhes de afeto, as memórias mais longínquas, os olhos marejados.
Candido compartilha com a neta, e conosco, suas lembranças de infância e juventude, a história de amor de uma vida, o afeto e cuidado que nutria e dedicava aos seus, além de suas contradições. Tudo isso permeado pelo seu humor bastante sincero e direto.
Segundo Marcelo Machado, um dos diretores do filme, o material coletado por Maria Clara se impôs: “Nunca havíamos feito um trabalho onde os caminhos ficavam tão claros desde o início. Preservar a intimidade e o caráter afetivo da conversa era o desafio, ou seja, as gravações pediam a menor interferência possível”.
As conversas entre Maria Clara Vergueiro e Antonio Candido foram todas registradas ao longo de quatro almoços no apartamento do avô. À época, sem pretensão de que virasse um filme, o intuito era guardar uma memória. “A preocupação era registrar as histórias familiares e o jeito de ser dele na intimidade, para preservar essas informações e memórias, mas também numa tentativa de mantê-lo eternamente vivo no nosso núcleo familiar”, conta Maria Clara.
Para ela, o filme também vai além da figura dos dois e toca no simbólico do amor puro que existe na relação entre um avô e uma neta, sendo um vínculo que “promove uma troca ‘intramundos’, onde os avós apresentam uma infinidade de referências fascinantes do passado e os netos respondem com as expressões vivas do mundo presente”, completa.
“Nesse documentário o que importa é o homem, o avô, não a obra. Cheguei a me questionar se alguém que não leu Antonio Candido poderia se interessar pelo conteúdo, mas a surpresa veio nas exibições, onde um público nem sempre atento ao que ele escreveu, se enterneceu pela relação do avô com a neta”, acrescenta Marcelo. Até o momento o documentário teve exibições pontuais: no Cinesesc, para público convidado, na Feira Internacional do Livro (FIL) — Ribeirão Preto, na Biblioteca de Obras Raras da Unicamp, que abriga a coleção de livros de Cândido, no Sesc Araraquara e na FLIP – Festa Internacional Literária de Paraty.
O filme aborda a trajetória de Candido desde a infância, e aos poucos vamos compreendendo como surgiu seu amor pelos livros, conhecemos sua trajetória acadêmica nas escolas de Filosofia e Direito, como era a relação com seus pais e chegamos ao enlace com Gilda de Melo e Sousa (1919-2005), carinhosamente chamada “Terbiolina”, apelido dado a ela pelo intelectual antes de tudo acontecer. Juntos, viveram um casamento de amor e admiração ao longo de 62 anos.
Candido, com bastante sinceridade e humor, revela sua vida para a neta e vamos, junto dela, nos surpreendendo com esse avô e a humanidade que existe em suas histórias, amores, contradições e receios, e que vêm antes do Antonio Candido escritor, professor e intelectual.
Para Fabiana Werneck, também diretora do filme, Antonio Candido era um curioso pela vida e pelas pessoas. “Isso reflete em suas narrativas. Numa época em que as pessoas têm se tornado cada vez mais individualistas e aguerridas, a atenção e celebração às trocas afetivas e afetuosas, no meu ponto de vista, são fundamentais, se não até urgentes. Viva a candura dos encontros afetivos!”, exalta.
“[O documentário] traduz, na minha visão, o que de mais especial havia no meu avô: a naturalidade, a leveza, a clareza e a coerência entre pensamento e atitude. Acredito que esse modo de ser tão simples seja chave para entender a obra dele e a sofisticação atribuída a ele”, completa Maria Clara.
FICHA TÉCNICA
Dir.: Fabiana Werneck e Marcelo Machado | Brasil | 2024 | 45 min | Livre
Realização: Sesc São Paulo
Produção: MMTV Marcelo Machado Produções
Pesquisa, roteiro e direção: Fabiana Werneck e Marcelo Machado
Produção executiva: Giovana Amano
Entrevistas: Maria Clara Vergueiro
Fotografia original: João Rosa
Imagens adicionais: Gustavo Almeida
Montagem: Yuri Amaral
Artes gráficas: Júlio Dui
Trilha sonora: Marcos Azambuja
MINIBIOS
Marcelo Machado começou sua carreira na produtora Olhar Eletrônico Vídeo, pioneira na produção audiovisual independente no Brasil. Dirigiu documentários como “Tropicália” (2012), “Com a Palavra Arnaldo Antunes” (2018), “Semana Sem Fim” (2022) e “Villa-Lobos em Paris” (2023). Fabiana Werneck é pesquisadora, roteirista e diretora. Assina roteiro e direção dos filmes “MAU WAL — Encontros traduzidos” (2002) e “Semana sem fim” (2023).
Fabiana Werneck é pesquisadora, editora de livros, roteirista e diretora. Foi roteirista e diretora de “Semana sem fim” (filme documentário Canal Curta 2023) e “MAU WAL — Encontros traduzidos (doc VideoBrasil, 2002)”. Também fez pesquisa e roteiro para “Guto Lacaz — O olhar iluminado (filme documentário Itaú Cultural Play, 2022)”, “Quanto mais cedo, maior” (série com Drauzio Varella |GloboPlay 2021),”50 anos do Balé da Cidade de São Paulo” (longa-metragem doc Arte1 2019) e “Não por acaso (longa-metragem ficção FOX e O2Filmes, 2007)”, entre outros.
Maria Clara Vergueiro é formada em Ciências Sociais (USP) e Jornalismo (Anhembi Morumbi), com Pós-Graduação em Influência Digital (PUC-RS). Atua há 20 anos como comunicadora, escrevendo, reportando, apresentando e produzindo em múltiplos formatos: da televisão às revistas, livros e mídias online, dos podcasts aos grandes eventos, com especial experiência no segmento esportivo e de saúde e bem-estar.
SOBRE O SESC SÃO PAULO
Com mais de 78 anos de atuação, o Sesc – Serviço Social do Comércio conta com uma rede de 42 unidades operacionais no estado de São Paulo e desenvolve ações para promover bem-estar e qualidade de vida aos trabalhadores do comércio de bens, serviços e turismo, além de toda a sociedade. Mantido por empresas do setor, o Sesc é uma entidade privada que atende cerca de 30 milhões de pessoas por ano. Hoje, aproximadamente 50 organizações nacionais e internacionais do campo das artes, esportes, cultura, saúde, meio ambiente, turismo, serviço social e direitos humanos contam com representantes do Sesc São Paulo em suas instâncias consultivas e deliberativas. Saiba mais em sescsp.org.br