Não existem ditadura boa ou lei antidemocrática boa. É importante e necessário ler a História e saber o que aconteceu para não repetirmos os mesmos erros e mesmas opções.
Por Virgilio Pedro Rigonatti*
1968, cujo cinquentenário comemoramos neste ano, foi marcante por alguns fatos que mudaram o mundo e por outros que afetaram nosso país, que merecem uma análise.
Em agosto deste memorável ano, os exércitos da URSS invadiram a Tchecoslováquia pondo fim ao sonho do governo de Alexander Dubcek de promover uma abertura política que restabeleceria as liberdades políticas. Desde a II Guerra Mundial o país foi dominado pela Rússia que introduziu o regime comunista, marcado por uma organização social, política e econômica, que impunham um regime ditatorial para melhor controle da sociedade. Todos os países da órbita soviética eram caracterizados por esta política que negava aos povos as liberdades de ir e vir, de se manifestar, de escolher livremente seus dirigentes e de terem uma imprensa livre.
Em 13 de dezembro deste mesmo ano, no Brasil, o governo militar sancionou o AI5, assumindo definitivamente uma ditadura imposta desde o movimento de 1964. A nova medida levou o país a um período de trevas, perdurada até 1985, apoiado pelos Estados Unidos que via com preocupação a escalada da esquerda comunista, pretendente ao controle do poder.
Enquanto o Império Comunista Russo agia com mão de ferro na Tchecoslováquia – como havia feito na Hungria em 1956, para impedir a instalação da democracia e manter o país sob seu domínio, deixando patente que não toleraria nenhum movimento de independência e de restabelecimento das liberdades nos países sob seu controle; os EUA agiam no Brasil, apoiando a ditadura instalada para evitar uma outra Cuba, debandado para Moscou, irritando Washington, que adotou a posição de não mais permitir um outro país de sua órbita virar casaca, nem que, para isso, tivesse de tomar a decisão de invadi-lo.
Sabemos todos dos desmandos praticados pelas ditaduras, tanto de direita quanto o de esquerda, comandadas pelas duas potências imperialistas. Não existem ditaduras boas.
Em maio desse mágico ano, um movimento universitário em Paris subverteu a ordem conservadora francesa propugnando arejar um conjunto de leis que mantinha em uma camisa de força as liberdades dos estudantes. “É proibido proibir”, gritavam, panfletavam e grafitavam os jovens, lutando contra as forças policiais do governo de Charles De Gaule. Em junho, no Rio de Janeiro, uma manifestação de estudantes mobilizou todo espectro da sociedade que pedia o fim das leis que impediam a liberdade dos cidadãos, em um arremedo de democracia. Lá, o movimento estudantil, se não derrubou de imediato o governo, levou a uma mudança política e de alterações legislativas, adaptando-se à nova realidade social. Aqui, a agitação dos jovens e parcela significativa da sociedade levou a um endurecimento do regime, resultando no AI5.
Enquanto em todas as grandes cidades do mundo onde havia liberdade, gigantescas manifestações eram observadas nas ruas – reivindicando o fim das guerras e o controle das armas atômicas, que punham em risco a própria sobrevivência humana; o silêncio absoluto era observado em Havana, Cuba, e Moscou, cujos governos ditatoriais impediam que os estudantes e a sociedade saíssem também às ruas para protestar contra o perigo nuclear e reivindicar as liberdades fundamentais do homem.
No cenário mundial, vemos, hoje, inúmeros países auto proclamados democráticos, mas que têm um conjunto de leis e instituições que atentam contra a liberdade e os direitos dos cidadãos, equivalendo-se, na prática, a uma ditadura, disfarçada, mas não menos ditadura.
Precisamos ter sempre em mente, relendo a história e observando o cenário mundial para tomarmos nossas decisões e marcarmos nossas posições, repetindo, que “Não existem ditaduras nem leis antidemocráticas boas”.
*Virgilio Pedro Rigonatti Nascido em 22 de março de 1948, no bairro de Vila Anastácio, na cidade de São Paulo, Virgilio Pedro Rigonatti começou a escrever aos 60 anos. Desde sempre o contador oral das riquíssimas histórias da família, descobriu um prazer imenso em escrever ao registrar em um blog a trajetória do clã. Após lançar seu primeiro livro, Maria Clara, a Filha do Coronel, pela Editora Gente, romance baseado na vida de sua mãe, decidiu fundar a sua própria editora, a Lereprazer, cujo título de estreia é Cravo Vermelho, uma história sobre 1968, o ano mais tenso da ditadura.