Ícone do site Dica de Teatro

Vestido de Noiva: a obra-prima de Nelson Rodrigues revisitada por Helena Ignez

Na nova montagem (em temporada, no Sesc Consolação, de 25/10 a 08/12) dirigida por Helena Ignez,
o embate entre memória, alucinação e realidade questiona os dilemas contemporâneos,
explorando vaidades e tragédias que ressoam com a sociedade atual.

 

Simone Spoladore, Lucélia Santos e Djin Sganzerla / Foto: Ale Catan

 

 

Uma das maiores obras da dramaturgia brasileira, “Vestido de Noiva”, de Nelson Rodrigues, ganha uma nova adaptação, que entrelaça teatro e cinema, sob a direção de Helena Ignez, trazendo ao palco do Sesc Consolação, de 25 de outubro a 08 de dezembro, um mergulho na complexidade humana e social. A peça, escrita e encenada pela primeira vez há 80 anos, retorna com a força de um clássico atemporal, cujas camadas de alucinação, memória e realidade se entrelaçam para explorar as relações humanas, o desejo e a tragédia.

 

Nesta montagem com Lucélia Santos, Djin Sganzerla, Simone Spoladore e elenco, o objetivo é revisitar Nelson Rodrigues, com o desejo de reverberar sua genialidade e destacar a atualidade de sua escrita. O conflito entre as irmãs Alaíde e Lúcia, e suas escolhas trágicas, alcança novos contornos em um cenário de redes sociais e vaidades infinitas, retratando o reflexo da sociedade contemporânea, onde as linguagens e interações humanas são moldadas pelas transformações tecnológicas e mudanças de paradigmas.

“Ao somarmos o talento de Helena Ignez

– e não apenas o talento,

mas toda a sua existência simbólica

– ao de Nelson Rodrigues,

teremos uma amálgama de beleza, arte,

cultura e sabedoria.”

Lucélia Santos

Helena Ignez, vencedora do Prêmio Funarte Mestras e Mestres das Artes 2023, é conhecida por sua ousadia artística e compromisso com a contestação social. Com uma carreira que começou nos anos 1960 e inclui colaborações em filmes do Cinema Novo, Helena se destaca por seu estilo provocativo e autoral, criando narrativas que desafiam as convenções. Sua intimidade com a obra de Nelson Rodrigues, que ela conheceu pessoalmente, traz uma perspectiva única e necessária a esta remontagem, evidenciando a relevância da peça para os desafios que enfrentamos hoje.

 

“Nelson é um gênio, a gente sabe disso,
e quando entra em contato íntimo com seus textos,

isso é reafirmado a cada momento,

ao ponto de não querer perder nada, nem a rubrica.”

Helena Ignez

 

É através do personagem de Madame Clessy, vítima de feminicídio, que a direção quer dar o recado, do ponto de vista social. Helena orquestra uma encenação que respeita cada detalhe da obra original, sem perder de vista a modernidade e a urgência das questões abordadas.

 

“Em nenhum momento Nelson se refere a ela como prostituta.

Madame Clessy é uma mulher de vida livre, que acusam de orgias. Não é uma prostituta. Ela tem um amante, um desembargador
que a conhece desde menina. Ela teve um filho

e é apaixonada por um jovem de dezessete anos. Clessy é uma ingênua

e o jovem um assassino, que a mata. É um feminicídio. O que me interessa mostrar, agora,
em Vestido de Noiva é esse feminicídio e o esterismo e a loucura dessa família tradicional, burguesa. Clessy é uma figura antiga, que Nelson situa no começo do século XX e eu a trago para hoje.
Uma mulher vítima da incompreensão e da inveja da sociedade, uma mulher vítima do feminicídio…

…Essa montagem é muito cabeça!”

Helena Ignez.

 

A peça conta com uma equipe criativa composta por Rafael Bicudo na assistência de direção, André Guerreiro Lopes na direção de imagens, Simone Mina e Carolina Bertier na direção de arte, cenografia e figurinos e Aline Santini (vencedora do Prêmio Shell em Melhor Iluminação com a peça “Mutações) na iluminação. A trilha sonora, com composições de Cida Moreira, é dirigida por Aline Meyer, enquanto a produção geral é coordenada por Marcela Horta.

 

Por fim, “Vestido de Noiva” reafirma o poder do teatro de Nelson Rodrigues em captar os dilemas humanos e sociais de ontem e de hoje.

 

A História

O enredo de “Vestido de Noiva”, a segunda peça de Nelson Rodrigues, é dividida em três planos que se inter-relacionam em ações simultâneas, em tempos diferentes, onde ocorrem as cenas da alucinação, da memória e da realidade, que estabelecem as molduras nas quais a agonizante Alaíde (Djin Sganzerla), protagonista, desvenda ao público espectador a história trágica de seu amor infeliz pelo marido Pedro, na qual tem como rival a irmã, Lúcia (Simone Spoladore). À narrativa de Alaíde misturam-se flashes urbanos de ruas e de trânsito, de uma sala de cirurgia, de uma redação de jornal. E ainda se entrelaça com a história de Madame Clessy (Lucélia Santos), vítima de feminicídio, no início do século XX. Na peça, Madame Clessy tem a função de ajudar Alaíde a reorganizar sua mente convulcionada, após o atropelamento.

 

A obra explora temas universais de amor, culpa, desejo e traição. A tensão permeia não apenas o conflito entre Alaíde e sua irmã Lúcia, mas também todas as relações entre os personagens.

 

“Vestido de Noiva” se revela como uma crítica social afiada, iluminando a hipocrisia e os valores da pequena burguesia carioca. Nelson Rodrigues não apenas desvenda as máscaras da sociedade, mas provoca a plateia com uma representação cáustica e crua da realidade. É uma obra que continua a ressoar com profundidade psicológica e relevância social, mantendo seu status como uma das mais inovadoras e influentes da dramaturgia brasileira.

 

Psicanálise freudiana, Nelson Rodrigues e a contemporaneidade

A psicanálise freudiana exerceu uma profunda influência sobre Nelson Rodrigues, especialmente na concepção de sua obra “Vestido de Noiva”. A peça reflete o contexto de uma época em que a psicanálise de Sigmund Freud ganhava destaque por suas teorias sobre o inconsciente, os desejos reprimidos e os conflitos internos que moldam o comportamento humano. Nelson Rodrigues absorveu esses conceitos e os aplicou em sua dramaturgia, explorando as camadas mais profundas da psique de seus personagens.

 

“Vestido de Noiva” revela essa influência ao estruturar-se em três planos distintos – realidade, alucinação e memória – que simbolizam o conflito interno de Alaíde, a protagonista, entre seus desejos inconscientes e suas experiências traumáticas. A peça se torna um espelho da mente humana, onde o passado e o presente se entrelaçam em um fluxo contínuo de memórias e alucinações. Esse método, inspirado pela psicanálise, oferece ao público uma experiência imersiva, forçando-o a confrontar os próprios desejos reprimidos e as suas contradições.

 

Na contemporaneidade, as questões exploradas por Nelson Rodrigues, como desejo, culpa, repressão e conflito entre o público e o privado, continuam extremamente relevantes. Em um mundo digital dominado pelas redes sociais e pela exposição constante, onde a vida privada se mistura à vida pública, as tragédias emocionais de seus personagens encontram novos paralelos. A psicanálise, assim como a obra de Nelson, permanece atual ao nos lembrar que, por trás das máscaras sociais, todos nós lutamos com nossas próprias verdades inconscientes.

 

__________________

HELENA IGNEZ é vencedora do Prêmio Funarte Mestras e Mestres das Artes 2023 e Prêmio Proac Lei Aldir Blanc por Histórico de Realização em Audiovisual 2021. Começou no teatro em 1960, em Salvador, na antológica montagem de A Ópera dos Três Tostões, de Bertolt Brecht, dirigida por Martim Gonçalves com cenários de Lina Bo Bardi, com Eugênio Kusnet como protagonista. Trabalhou como atriz com alguns dos mais importantes diretores como Judith Malina, Ziembinski, Antônio Abujamra, Bibi Ferreira, Ademar Guerra, Maurice Vaneau, André Guerreiro Lopes, Ulysses Cruz, Marcio Aurélio, entre outros. Atuou em Os Sete Afluentes do Rio Ota, direção de Monique Gardenberg. Atuou em Vestido de Noiva e Pessoas Sublimes com Os Satyros, direção de Rodolfo Vázquez. Dirigiu Savannah Bay de Marguerite Duras e Cabaret Rimbaud – Uma Temporada no Inferno, de sua autoria, para o Festival de Artes em Barcelona. Em cinema dirigiu, entre outros filmes, Canção de Baal, vencedor do Prêmio de Melhor Filme pelo Júri da Crítica no Festival de Gramado; Luz nas Trevas, Prêmio da Crítica Boccalino d’Oro de Melhor Filme no Festival de Cinema de Locarno, Prêmio Melhor Filme pelo público e Prêmio Melhor Direção pela Crítica no Cine Esquema Novo, Prêmio APCA Melhor roteiro adaptado; Ralé, vencedor do prêmio Melhor Direção no 23º Festival Mix Brasil e no 39º Festival Guarnicê de Cinema; A Moça do Calendário, Grande Prêmio Competição Nacional no Femina, Prêmios do Público no 21º Festival de Cinema Luso Brasileiro de Santa Maria da Feira e sete prêmios no 41º Festival Guarnicê de Cinema; FAKIR, Prêmio Melhor Filme Júri Popular no 9º CineFantasy e Prêmio Melhor Filme Longa Metragem pelo Júri Oficial no Festival As Amazonas do Cinema; A Alegria é a Prova dos Nove, Prêmio Especial do Júri da Competição Internacional no FEMINA. Helena recebeu homenagens em festivais como no 20º Fribourg International Film Festival, na Suíça, com a Mostra La Femme du Bandit e no 17º Kerala International Film Festival, na Índia, além de ter sido a homenageada de 2017 do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e em 2021 foi homenageada na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, 45ª edição, recebendo o Prêmio Leon Cakoff.

__________________

LUCÉLIA SANTOS é uma atriz brasileira nascida em Santo André, São Paulo, em 1957, tendo estreado no teatro em 1972. São 51 anos de carreira no teatro, cinema, televisão e viagens internacionais na difusão da produção cultural brasileira. Viagens nacionais constantes com todos os espetáculos teatrais em que atua ou dirige. São mais de 100 títulos entre filmes, novelas, peças, participações especiais, narrações, curtas-metragens etc. Atua como atriz, diretora e produtora e em alguns casos, como autora. Tornou-se conhecida mundialmente por causa da novela “A escrava Isaura”, que teve o papel de abrir as portas e janelas internacionais para as produções brasileiras em todo o mundo. Além de artista, sempre atuou como cidadã ativista e militante nas causas socioambientais e culturais brasileiras, em especial na Floresta Amazônica, onde ao lado de Chico Mendes, Lula e outros companheiros, luta pela defesa e pela salvação da Amazônia da destruição.

__________________

DJIN SGANZERLA é atriz, diretora de cinema, produtora e co-fundadora da Cia teatral Estúdio Lusco-Fusco ao lado de André Guerreiro Lopes. Recebeu diversos prêmios, entre eles o APCA de Melhor Atriz de Cinema; Melhor Atriz no 12º Festival de Cinema Luso Brasileiro, Portugal; Melhor Atriz no Festival de Cinema de Natal, Melhor Atriz Coadjuvante no 39º Festival de Cinema de Brasília, Melhor Atriz no 28º Cine PE 2021, entre outros. Em 2024 dirigiu seu segundo longa-metragem, o thriller Eclipse, em finalização, lançamento em 2025. Estreou na direção cinematogracica com “Mulher Oceano”, seu primeiro longa metragem como diretora, vencedor de 15 prêmios nacionais e internacionais, entre eles, Melhor Filme no Porto Femme International Film Festival em Portugal. Em teatro atuou em “Insônia – Titus Macbeth”, no papel de Lady Macbeth, “Tchekhov é um Cogumelo”, com temporadas em São Paulo, Rio e apresentado no 52º FITEI no Porto, em Portugal, com direção de André Guerreiro Lopes, “A Melancolia de Pandora”, com direção do americano Steven Wasson (Theatre de l’Ange Fou – EUA) e André Guerreiro Lopes, “Ilhada em Mim – Sylvia Plath”, “O Livro da Grande Desordem e da Infinita Coerência”, direção de André Guerreiro Lopes, “Frank-1” de Samir Yazbek, direção Hélio Cícero e Samir Yazbek, “O Belo Indiferente”, monólogo de Jean Cocteau escrito para Edith Piaf, direção André Guerreiro Lopes e Helena Ignez, entre outros. Atua em “Savannah Bay” de Marguerite Duras, direção Rogério Sganzerla, “Cacilda”, de José Celso Martinez Corrêa, atua no Centro de Pesquisas Teatrais (CPT), dirigido por Antunes Filho em 1997 e em “O que é bom em segredo é melhor em público”, com textos de Nelson Rodrigues, dirigido por Antônio Abujamra – Rio de Janeiro 1996. Em cinema atuou em mais de vinte longas metragens, com diretores como: Carlos Reichenbach, Paulo Cesar Saraceni, Helena Ignez, Júlio Bressane, Rogério Sganzerla, Bruno Safadi, o diretor português Rodrigo Areias, entre outros.

__________________

SIMONE SPOLADORE nasceu em Curitiba, aos 8 anos entrou na Escola de Dança do Teatro Guaíra onde ficou até os 16 anos praticando dança clássica. Foi com essa idade que fez sua estreia profissional no teatro, trabalhou com importantes diretores como Fernando Kinas, Felipe Hirsh, Marcio Abreu, Aderbal Freire Filho. Em 2012, interpretou Maggie de Depois da Queda de Arthur Miller com direção de Felipe Vidal e em 2023, protagonizou O Tempo e a Sala de Botho Strauss com direção de Leandro Daniel. Faz sua estreia no cinema em Lavoura Arcaica, trabalhando em mais de trinta filmes, entre eles: Desmundo de Alan Fresnot, Elvis e Madona de Marcelo Laffite, Sudoeste de Eduardo Nunes, A Memória que me contam de Lúcia Murat, O Livro dos Prazeres de Marcela Lordy, Aos Pedaços de Ruy Guerra, Leme do Destino de Julio Bressane. Com a diretora Helena Ignez fez 4 filmes: A Canção de Baal, A Volta do Bandido da Luz Vermelha, O Poder dos Afetos e Ralé. Seus últimos trabalhos na TV foram Éramos Seis da TV Globo e Cidade Invisível da Netflix.

 

 

Ficha Técnica

Texto: Nelson Rodrigues

Direção: Helena Ignez

Assistência de Direção e Direção de Cena: Rafael Bicudo

 

Elenco:

Madame Clessi – Lucélia Santos

Alaíde – Djin Sganzerla

Lúcia – Simone Spoladore

Pedro – Jiddu Pinheiro

Dona Lígia (mãe) – Clarisse Abujamra

Gastão (pai) – Luciano Chirolli (participação especial)

Dona Laura (sogra) – Tuna Dwek

Mãe do namorado – Michele Matalon

Mulheres do bordel – Luciana Fróes e Luiza Barros

Vozes off: Luciano Chirolli

 

Direção de Imagem (vídeo): André Guerreiro Lopes

Direção de Arte, Cenografia e Figurinos: Simone Mina e Carolina Bertier

Visagismo: Roger Ferrari

Iluminação: Aline Santini

Trilha Sonora e Sonoplastia: Aline Meyer

Arranjos e canto: Cida Moreira

Pandeiro: Toni Nogueira

Vídeo Mapping: André Grynwask e Pri Argoud – Um Cafofo

 

Assistência de direção de imagem (vídeo): Rafael Talib

Assistência de Cenografia: Vinicius Cardoso

Assistência de Figurinos: Rick Nagash e Hellige Santana

Programação e Operação de luz: Sibila

Montagem de luz: André Mutton

Programação e Operação de som: Kléber Marques

Operação de Vídeo: Rodrigo Chueri

Contrarregras: Júlia Cristina Cordeiro e Azre Maria Tarântula

Cenotecnia: Sasso Campanaro, Luciano Sampaio e Patrick Sanchez

Fotos de Divulgação: Ale Catan

Assessoria de Imprensa: Ney Motta

Gestão de mídias sociais: Sinny Comunicação

 

Assistência de Produção: Alana Campos

Produção Executiva: Luiza Barros

Direção de Produção: Marcela Horta

Realização: SESC SP

 

 

SERVIÇO

“Vestido de Noiva”
Temporada: 25 de outubro a 08 de dezembro de 2024

Dias/Horário:

Sextas e Sábados, às 20h | Domingos e feriados, às 18h – *não haverá sessão em 27/10 e 20/11

Quinta, 21 de novembro e 05 de dezembro, às 15h

Sesc Consolação – Teatro Anchieta (280 lugares)

Rua Dr. Vila Nova, 245, Vila Buarque. São Paulo – SP

Telefone: (11) 3234-3000

Na rede: /sescconsolacao – Site: sescsp.org.br/consolacao

Horário de funcionamento:

Terça a sexta: das 10h às 21h30. Sábados: das 10h às 20h. Domingos e Feriados: das 10h às 18h.

 

Ingressos: R$70,00 (inteira), R$35,00 (meia-entrada), R$21,00 (credencial plena).

Venda on-line: disponível em sescsp.org.br e no app Credencial Sesc SP

Venda presencial: disponível na bilheteria de qualquer unidade do Sesc SP

Duração: 110 min

Classificação indicativa: nãorecomendado para menores de 16 anos

Acessibilidade: teatro acessível a cadeirantes e pessoas com mobilidade reduzida


Sair da versão mobile